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Entrevista com Vander Costa

CNT vê ano de 2022 mais estável, mas acredita que desafios seguirão impactando os diferentes segmentos de transporte


Atual presidente da Confederação Nacional do Transportes (CNT), Vander Costa é graduado em administração pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e em direito pela Faculdade Newton Paiva. Sempre atuante no transporte rodoviário de cargas, Vander foi presidente do Sindicato das Empresas de Transportes de Carga do Estado de Minas Gerais (Setcemg) entre 2002 e 2008 e da Federação das Empresas de Transporte de Carga de Minas Gerais (Fetcemg) por dois mandatos, de 2009 a 2016.


Finalizando agora seu quarto ano como presidente da confederação, Vander vê como primordial a manutenção da desoneração para os principais setores da economia. “A desoneração universal precisa vir, mas, para ter viabilidade orçamentária, depende da criação de outro tributo. Essa é uma discussão que precisa ser enfrentada com seriedade e disposição para negociar”.


Confira a entrevista completa:


Presidente Vander, como de costume, estamos aqui novamente para entrevistá-lo para o Anuário NTC&Logística. Iniciando nosso bate-papo, gostaríamos de que o senhor nos contasse um pouco sobre quais foram os principais desafios da CNT neste ano de 2022 e se o senhor considera que tivemos um ano mais estável do que 2021.

Resposta: Superado o pico da pandemia, enfrentamos o desafio da volta à normalidade, o que, de fato, ainda não ocorreu: houve uma paralisação no avanço das políticas públicas, não conseguimos avançar na privatização das rodovias e as obras decorrentes das autorizações ferroviárias ainda não foram iniciadas. Apesar de não vermos um avanço nas obras de infraestrutura, muita coisa foi trabalhada, e esperamos ver alguma coisa iniciada no ano que vem.

A maior dificuldade enfrentada em 2022 foi no Poder Legislativo, com a nova forma de serem votados os projetos com a supressão de prazos e, ainda, com a falta de parlamentares em Brasília e no Congresso. Esperamos que, com o fim da pandemia, o rito legislativo volte a ser tratado como consta no regimento.

Com relação à pandemia, o ano de 2022 foi, sem dúvida, mais estável do que 2021, mas a alta nas taxas de juros e o ano eleitoral trouxeram problemas diferentes, que precisaram ser enfrentados. Cada ano apresentou um desafio diferente, assim como será nos próximos.


Depois de mais de dois longos anos de pandemia, aparentemente voltamos à normalidade no decorrer deste ano. O desempenho do mercado de trabalho no transporte nos sete primeiros meses de 2022 é superior ao mesmo período de 2021. A diferença é que houve 17.506 novos postos, o que representa um crescimento de 36,5% segundo estudos da CNT. Em sua visão, quais foram os principais fatores para esse crescimento do mercado de trabalho no setor de transporte?

O transporte rodoviário de cargas continua crescendo acima do crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), como mostra recente publicação da CNT. O setor de passageiros, da mesma forma, conta com alguns segmentos trabalhando com volumes de passageiros no nível anterior à pandemia. Isso responde à pergunta: só não estamos contratando mais por falta de mão de obra qualificada. O crescimento da contratação de mão de obra é um fenômeno nacional e é consequência do crescimento econômico que, neste ano, já se aproxima de 3%.

Apesar da melhoria significativa em comparação ao que estávamos vivendo, o ano de 2022 não está sendo um ano sem desafios, como falado anteriormente. Gostaríamos de que o senhor nos falasse um pouco sobre a atuação da CNT em prol do setor neste ano e quais foram as principais conquistas da entidade neste ano.


O trabalho é constante. Posso ressaltar como conquista o reconhecimento da prevalência do negociado sobre o legislado no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF). Negociamos muito também sobre o seguro no transporte de cargas, mas, até agora, não tivemos nenhum avanço concreto. Além disso, conseguimos, com muito trabalho, manter o percentual de mistura do biodiesel no diesel em 10%. No entanto, talvez nossa maior conquista tenha sido não deixar retroceder a legislação do nosso setor.


Agora destacando o transporte rodoviário de cargas, foco da atuação da NTC, como o senhor avalia o ano dos transportadores diante de grandes desafios, como o aumento dos insumos e, principalmente, das questões dos combustíveis, que impactaram o setor durante o período?


Os combustíveis subiram no mundo inteiro, e a única alternativa é repassar o aumento de insumos para os preços. O transportador deve observar o mercado, que está em crescimento contínuo, portanto existe demanda. Isso significa que o mercado está disposto e consciente da necessidade de pagar o custo do transporte.

Nós, do Sistema CNT, estamos investindo muito na qualificação dos empresários e dos executivos por meio dos cursos de pós-graduação e de certificações internacionais do Programa Avançado de Transporte, que é ofertado pelo SEST SENAT e coordenado pelo Instituto de Transporte e Logística (ITL). Nosso objetivo é qualificar os empresários para a necessidade de trabalharem com lucros.


Temos que fazer igual ao dono de uma padaria, que aumenta o preço do pão toda vez que o preço do trigo aumenta. Se os nossos custos sobem, temos que repassá-los. Se o cliente não aceitar, ele deixa de tirar a carga. A tendência é de alta no preço do diesel, e vai continuar assim. Quando trocarmos para outra matriz energética, menos poluente, vai ficar mais caro ainda.

Após o corte do ICMS, o cenário melhorou para as empresas do TRC e para a sociedade como um todo, porém o corte deve seguir apenas até o final deste ano. O que o senhor acredita que deve ser feito para que os combustíveis não voltem a subir logo na virada para 2023? Como o Brasil pode conter melhor esse cenário de aumento mundial com relação aos barris de petróleo?


Não vi nenhum corte de ICMS no diesel, pois as alíquotas já eram menores que 18%. Houve corte significativo no ICMS da gasolina. No diesel, a redução ocorreu porque o preço do barril de petróleo caiu no mercado internacional.

Focando agora na atuação do SEST SENAT, gostaríamos de que o senhor nos falasse um pouco sobre a atuação da organização e, também, sobre como o SEST SENAT atuou em 2022 para auxiliar os motoristas na qualificação profissional e no cuidado que a categoria merece.


A atuação do SEST SENAT continuou a cumprir o programado, inaugurando unidades com o simulador de direção e aumentando a oferta dos treinamentos para os motoristas de todo o Brasil. Cabe registrar que, como legado da pandemia, o portfólio de cursos foi alterado, e passamos a ofertar cursos no formato de web aulas, que são aulas on-line ao vivo, além dos cursos da EaD. Tudo isso visou facilitar o acesso aos conteúdos e permitir que mais profissionais estejam preparados para o mercado de trabalho.

Seguindo com os motoristas, estamos vivendo um momento de falta de mão de obra para essa atividade não só no país, mas também no mundo como um todo. Porém, o Brasil ainda possui uma categoria muito masculina, em que estudos da própria CNT mostram que 99,5% dos profissionais da área são homens. O que o setor deve fazer para profissionalizar mais mulheres e se tornar mais atrativo para que essa mão de obra qualificada também venha por meio de mulheres motoristas?

Defendo que a mulher tem de estar onde ela quiser. Se quiser ir para a boleia do caminhão, nós teremos muito prazer em qualificá-la. Nesse sentido, o SEST SENAT tem desenvolvido algumas iniciativas que contribuem para que as mulheres possam estar preparadas para ocupar posições de trabalho no setor de transporte. Alguns conteúdos específicos estão disponíveis no portal da EaD.

Para finalizarmos o nosso tópico “SEST SENAT”, temos visto um crescimento na parceria entre esta entidade, a CNT e o ITL para a realização de cursos que visam à profissionalização e à extensão do conhecimento dos empresários do setor. Quais são, na sua visão, os principais impactos positivos que a expansão desses cursos trará para o segmento como um todo?

Trabalhamos como um sistema integrado. A CNT, o SEST SENAT e o ITL têm foco em seus respectivos objetivos e em sua missão institucional, mas todos estão atentos ao desenvolvimento e ao crescimento do transporte.

Temos trabalhado muito diretamente com os empresários para mostrar a eles a conveniência de usarem mais os serviços do SEST SENAT. Temos obtido êxito, batendo recordes de atendimento ano a ano, o que foi interrompido apenas durante a pandemia.

Da mesma forma, o ITL tem buscado atender ao maior número de empresários e empresas aumentando a oferta de cursos. O objetivo é melhorar o ambiente de negócios, qualificando as pessoas responsáveis pela alta gestão, além de realizar eventos sobre temas relevantes para o setor de transporte.

Trazendo pautas de âmbito nacional, as concessões e privatizações continuaram sendo um assunto recorrente no governo em 2022, porém, com as eleições deste ano, podemos ver uma mudança nesse cenário? O senhor acredita que o caminho para a evolução da nossa infraestrutura e do desenvolvimento dos serviços no país é continuar apostando nas privatizações e concessões nos próximos anos?


Acredito que as concessões continuarão, principalmente as rodoviárias, independentemente da eleição. Algumas ferrovias autorizadas podem ter seus projetos iniciados, principalmente aquelas ligadas a algum negócio, como a indústria de celulose. Com relação à continuidade das privatizações, teremos que esperar o resultado das eleições para fazermos uma avaliação mais acertada. O Brasil precisa continuar apostando nas privatizações e nas concessões como forma de acelerar o crescimento econômico, mas isso não é suficiente. O investimento de recursos públicos na infraestrutura ainda é indispensável.

Continuando no âmbito político, as reformas tributária e administrativa, apesar de serem pauta desse governo, não aconteceram nesse primeiro mandato. Na sua visão, por que o atual governo não seguiu com essas pautas? O senhor ainda acredita que essas reformas acontecerão nos próximos anos?


São reformas necessárias que, apesar de estarem na pauta deste governo, não aconteceram por falta de vontade política. Não houve uma mobilização efetiva do Executivo para ter as reformas aprovadas. Pode acontecer alguma coisa com relação à matriz de tributos, a depender do resultado das eleições.

A reforma administrativa não avançou por conta da força do corporativismo dos empregados públicos, que querem manter para sempre os benefícios atuais. A reforma é necessária para termos um serviço público melhor. É preciso passar essa mensagem para os brasileiros.

As propostas de reforma tributária são ruins, não desburocratizam nada e aumentam a carga tributária. Não houve espaço para diálogo sobre esse tema pelos setores de serviços, inclusive o transporte e o agropecuário, com os Poderes Executivo e Legislativo. As reformas são necessárias e deverão acontecer talvez no começo do próximo mandato, a depender da formação do Congresso Nacional e da disposição do Poder Executivo eleito.

Outro assunto recorrente nas nossas entrevistas é a desoneração da folha de pagamento. Em janeiro deste ano, a desoneração foi aprovada e prorrogada para 17 setores da economia brasileira, dentre eles o transporte. Porém, muitos empresários de outros setores estão buscando ampliar a abrangência da desoneração. Para você, qual seria o impacto dessa medida?


A desoneração universal precisa vir, mas, para ter viabilidade orçamentária, depende da criação de outro tributo. Essa é uma discussão que precisa ser enfrentada com seriedade e disposição para negociar.

Partindo para a fase final da nossa entrevista, tivemos um ano de 2022 mais positivo do que os anos anteriores, apesar dos desafios. Neste ano, temos eleições presidenciais, e muitas questões podem ser afetadas. Quais são as expectativas da CNT com relação ao país para o ano de 2023?


Esperamos que o país continue crescendo. Pelos negócios já contratados, como concessão de portos e aeroportos e mais algumas rodovias que virão junto com o 5G, temos como crescer no mesmo patamar deste ano, na casa de 2% a 3% aproximadamente. Precisamos ter em mente que mais importante do que as eleições presidenciais são as eleições para o Congresso Nacional, que, segundo especialistas, tendem a se manter no centro com viés de direita, o que não vai prejudicar o crescimento. Precisamos melhorar a nossa exposição sobre o meio ambiente, em que seja permitido o crescimento social da população da Amazônia sem desmatar, o que é possível com atividades geradoras de riqueza, como o garimpo legalizado e com responsabilidade ambiental.


A CNT espera o crescimento do Brasil na indústria, na agricultura, no comércio, no turismo, pois assim teremos cargas e pessoas para transportar em abundância, fazendo com que o transporte continue crescendo.

Por último, mas não menos importante, gostaríamos de que o senhor deixasse uma mensagem para os transportadores que estão nos assistindo ou lendo a entrevista por meio do Anuário.


Cuidem das suas empresas pelos seus filhos! O lucro é essencial para ter uma empresa saudável. Caso tenham dificuldades de entender isso por causa da pressão do mercado, participem ou mandem um dos seus gestores para os cursos de gestão que oferecemos por meio de grandes instituições, como a FDC. Seus filhos precisam ter orgulho de dizer que os pais deixaram uma empresa saudável, que gera lucros, que distribui dividendos e que é um local onde eles podem escolher trabalhar como executivos ou podem ser apenas sócios e receber dividendos.


Se optamos por apenas agradar o cliente, sem uma visão de futuro, corremos o risco de ter prejuízo e de deixar uma empresa com dívidas para seus sucessores.

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