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Entrevista com Márcio de Lima Leite

Presidente da Anfavea vê mescla de empresas na gestão da entidade como fundamentais para o setor

Márcio de Lima Leite assumiu a presidência da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) em maio de 2022 após passar boa parte de sua carreira atuando no Grupo Fiat. O executivo também atua como vice-presidente de assuntos jurídicos, tributários e de relações institucionais da Stellantis na América do Sul.


Agora à frente de uma entidade importante para o segmento de transporte, Márcio acredita na mescla de empresas produtoras dos mais variados tipos de veículos à frente da associação para o sucesso de suas atividades. “Isso nos dá uma amplitude de atuação que nos coloca como protagonistas em qualquer discussão sobre mobilidade urbana, sobre transporte rodoviário de cargas e de passageiros e sobre ferramentas no mundo agrícola, na mineração, nas obras de infraestrutura, entre outras”.


Confira a entrevista completa:


Presidente Márcio, o senhor assumiu a presidência da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores em maio de 2022. Gostaria que nos contasse um pouquinho de como foi sua carreira até chegar a esse cargo, tão importante para o setor de transportes.


Resposta: Tive a felicidade de trabalhar a maior parte de minha carreira no Grupo Fiat, na época com forte atuação em máquinas agrícolas e rodoviárias, caminhões, autopeças, bancos e seguradora. E esse leque foi ampliado posteriormente com a fusão com a Chrysler (FCA) e mais recentemente com o Grupo PSA (Stellantis). Isso me permitiu também trabalhar em várias áreas de uma empresa em expansão. Faço um destaque para as negociações e para a concretização da construção da fábrica do grupo em Goiana, na divisa de Pernambuco com a Paraíba, onde hoje são produzidos modernos modelos da Jeep e da Fiat. Ver o poder transformador e o progresso que a indústria automobilística pode levar para uma região é algo que até hoje me inspira como dirigente da principal associação do setor. Antes da Fiat trabalhei na KPMG e na Deloitte.


O senhor assumiu seu cargo em um momento de retomada econômica, porém com eleições a caminho. Quais os principais desafios você teve ao chegar à presidência da Anfavea e quais devem ser os desafios para o próximo ano?


Meu amigo e antecessor Luiz Carlos Moraes enfrentou um dos momentos mais delicados para a humanidade e para toda a indústria, que foi a pandemia. Assumi a Anfavea num momento um pouco mais ameno e repleto de desafios. A soma da transformação tecnológica do setor, que já vinha em curso, com a reorganização das cadeias globais de fornecimento fruto da pandemia abre uma série de oportunidades para um player com a grandeza e o potencial do Brasil.


Na sua chapa temos representantes da General Motors, da Scania e da Audi. Qual a importância de ter essas diferentes empresas representadas na Anfavea e quais os benefícios que essa mescla de empresas pode trazer para o segmento como um todo?


A riqueza da Anfavea é essa mescla de empresas produtoras dos mais variados tipos de veículos nos segmentos de automóveis, comerciais leves, caminhões, ônibus, máquinas agrícolas e máquinas rodoviárias, e dentro desse universo temos marcas generalistas, marcas premium a até marcas de luxo. Isso nos dá uma amplitude de atuação e nos coloca como protagonistas em qualquer discussão sobre mobilidade urbana, sobre transporte rodoviário de cargas e de passageiros e sobre ferramentas no mundo agrícola, na mineração, nas obras de infraestrutura, entre outras.


Quais são os principais objetivos do seu mandato, que vai de 2022 até 2025? Como vocês enxergam o setor atualmente e como pretendem que ele esteja no final do último ano de mandato?


Nosso foco principal de atuação é a descarbonização do setor automotivo e a reindustrialização no Brasil, no sentido de recuperar não apenas o nosso parque de fornecedores e de elevar seu nível tecnológico de forma que possamos ser produtores e exportadores de itens de alta tecnologia, mas também de atrair investimentos das montadoras para o país. Nesse período de transição, podemos e devemos ser exportadores de motores e de veículos a combustão de alta eficiência para países subdesenvolvidos, que ainda não têm condições de eletrificar sua frota. Esses próximos anos serão decisivos para definir o que será da indústria brasileira nas próximas décadas. Para isso, vou perder muitas horas de sono até o final do mandato, em maio de 2025, mas sairei feliz se todo o ecossistema automotivo estiver num ciclo virtuoso que é plenamente possível em um setor com nossa resiliência, competência e inventividade.


Passando agora para uma análise do setor de atuação da Anfavea, nós tivemos por todo o período da pandemia um grande problema com atrasos no desenvolvimento e nas entregas dos veículos. Mais especificamente com relação aos caminhões, como estamos com relação a essa questão atualmente? Já é possível sentirmos a volta da normalidade?


A pandemia dificultou muito os trabalhos de desenvolvimento, de testes e de homologações, especialmente dos caminhões, que estavam à beira do P8, uma nova e desafiadora fase do Proconve. O prazo legal para essa fase é janeiro de 2023, e todos os associados estão trabalhando em dobro para recuperar esses atrasos. Muitas dessas tecnologias poderão ser conhecidas em novembro na Fenatran. Creio que todos chegarão ao próximo ano com quase toda a gama apta a atender à regulamentação ambiental.


Quais são os principais fatores que ainda afetam a produção dos veículos automotores e do segmento como um todo?


O maior gargalo ainda são os semicondutores, presentes nas centenas de componentes eletrônicos de um veículo moderno. Deixamos de produzir mais de 370 mil veículos no ano passado por esse motivo. Este ano, as perdas já se aproximam da casa das 200 mil unidades. No entanto, felizmente o segundo semestre deste ano começou com um maior fluxo de componentes, que permitiu que a produção finalmente atingisse um patamar mais próximo do que era antes da pandemia. Dessa forma, estamos atendendo aos poucos a demanda reprimida de pessoas físicas, de frotistas e de contratos de exportação. Vamos sofrer ainda por alguns meses com essa questão, mas aposto num 2023 mais próximo de nossa capacidade normal produtiva. Muitas fábricas de semicondutores serão inauguradas no mundo até o final do ano que vem para atender essa demanda crescente de todos os setores industriais. Nós da Anfavea também estamos batalhando junto a entidades públicas e privadas para que o país atraia fabricantes desse componente cada vez mais essencial.


Além de presidente da Anfavea, o senhor também é vice-presidente de assuntos jurídicos, tributários e de relações institucionais da Stellantis na América do Sul. Com foco nessa atuação, eu gostaria que o senhor nos falasse sobre a importância de termos uma reforma tributária no Brasil para recebermos mais investimentos estrangeiros e para que montadoras como a Ford não deixem mais o país.


Tenho muito orgulho de dizer que também atuo como professor na área tributária há mais de duas décadas e que por isso sempre me dediquei muito a essa matéria. A reforma tributária é a mãe de todas as reformas: precisa ser feita com urgência pelos vencedores das eleições, que vão assumir seus cargos em janeiro de 2023. Precisamos simplificar os impostos em um primeiro momento e reduzi-los assim que possível. O Custo Brasil é a maior barreira a todas as pautas que mencionei anteriormente: asfixia nossa indústria, pune os consumidores, prejudica as exportações. O maior exemplo é o IPI, o Imposto sobre Produtos Industrializados, algo que o próprio ministro Paulo Guedes classificou como uma excrecência, algo que não existe em outros países e que deve ser eliminado com a maior urgência.


Para falarmos agora do segmento de transporte rodoviário de cargas, gostaria que o senhor nos contasse um pouquinho da sua atuação nesse setor e como entende a importância dele para o desenvolvimento da economia brasileira.


O transporte rodoviário de cargas é a veia pulsante da nossa economia, e a maior prova disso foi dada durante a pandemia, quando o Brasil parou, a exemplo de todo o mundo, mas a sobrevivência da população foi garantida pela continuidade das operações de transporte. Sem isso, não teríamos tido alimentos e medicamentos para atravessar essa grave crise sanitária e humanitária. Esse setor carrega nas costas a riqueza da nação, quase todo o nosso Produto Interno Bruto (PIB). É uma rede complexa que interliga um país de dimensões continentais como o nosso e que ajuda a escoar nossos produtos para consumo interno e para as exportações. Tenho um orgulho imenso por trabalhar em uma indústria que fornece produtos para um setor crucial para nossa economia e para nossa sociedade.


Qual a importância de entidades como a Anfavea e NTC&Logística andarem juntas e estreitarem suas relações para o desenvolvimento do setor?


Pela complexidade e pela importância de nossas áreas de atuação, é fundamental que associações como as nossas, e outras de nosso ecossistema, estejam juntas na vocalização ao poder público e à sociedade das demandas essenciais à sobrevivência e ao desenvolvimento do nosso negócio.


Para finalizarmos, eu gostaria que o senhor nos passasse um pouco da sua expectativa para o ano de 2023 tanto para a economia brasileira como para o setor de fabricantes de veículos automotores.


Depois do primeiro respiro que tivemos em 2022, após dois anos pesados de pandemia, espero um 2023 que signifique um marco em uma retomada vigorosa para o país, em todos os sentidos. Sabemos que não será uma travessia simples e que demandará muito senso de responsabilidade e de urgência por parte dos governantes e legisladores que estarão no comando dos estados e do país a partir do próximo ano. Acho que já passamos o período de maior turbulência na economia. Se não vierem surpresas desagradáveis como a invasão da Ucrânia pela Rússia, acho que será um ano de crescimento moderado em nível global. Para nosso setor, acho que as questões de oferta estarão mais equacionadas. Se houver algum alívio em questões que prejudicam a demanda, como os juros, a inflação em alta e a perda de confiança, poderemos ter um ano de crescimento moderado em todos os nossos indicadores.



Presidente, Márcio, gostaríamos que o senhor também deixasse uma mensagem para o presidente Francisco Pelucio, que neste ano completará seu último ano da primeira gestão à frente da NTC&Logística.


Até por estar poucos meses à frente da Anfavea, tive um contato breve com o presidente Francisco Pelucio, mas que foi suficiente para perceber sua paixão pelo setor de transportes, seu brilho nos olhos, seu profundo conhecimento e senso de liderança. Espero, na convivência que teremos na Fenatran, aprender ainda muito mais com ele sobre esse pulsante setor. Desejo que essa parceria seja muito frutífera ao longo dos próximos anos, com ele e com toda a sua competente equipe da NTC&Logística.


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