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Decreto 10.854 de 10/11/2021 e as normas trabalhistas infralegais


Narciso Figueirôa Junior, assessor jurídico da NTC&Logística

Em 11/11/2021 foi publicado no Diário Oficial da União o Decreto Presidencial 10.854, de 10/11/2021, que regulamenta disposições relativas à legislação trabalhista e institui o Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas Trabalhistas infralegais e o Prêmio Nacional Trabalhista e altera o Decreto 9.580, de 22/11/2018.


Além de instituir o Programa Permanente de Consolidação, Simplificação e Desburocratização de Normas trabalhistas e o Prêmio Nacional Trabalhista Decreto, regulamenta os seguintes temas: 1) Livro de Inspeção do Trabalho Eletrônico; 2) fiscalização das normas de proteção ao trabalho e de segurança e saúde no trabalho; 3) diretrizes para elaboração e revisão das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho; 4) certificado de aprovação do equipamento de proteção individual; 5) registro eletrônico de controle de jornada; 6) mediação de conflitos coletivos de trabalho; 7) empresas prestadoras de serviços a terceiros; 8) trabalho temporário; 9) décimo terceiro salário; 10) relações individuais e coletivas de trabalho rural; 11) vale-transporte; 12) Programa Empresa Cidadã; 13) situação de trabalhadores contratados ou transferidos para prestar serviços no exterior; 14) repouso semanal remunerado; 15) Relação Anual de Informações Sociais (RAIS); e 16) Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT).


PROGRAMA PERMANENTE DE CONSOLIDAÇÃO, SIMPLIFICAÇÃO E DESBUROCRATIZAÇÃO DE NORMAS TRABALHSITAS


O programa abrangerá a revisão e a consolidação de normas trabalhistas e a melhoria dos serviços prestados pela Secretaria de Trabalho da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia com revisão da legislação trabalhista e com a compatibilização das matérias em atos normativos com as políticas e as diretrizes do governo federal.


Compreenderá os seguintes eixos de iniciativas: legislação trabalhista, relações de trabalho e políticas de trabalho; segurança e saúde no trabalho; inspeção do trabalho; procedimentos de multas e recursos de processos administrativos trabalhistas; convenções e recomendações da Organização Internacional do Trabalho (OIT); profissões regulamentadas e normas administrativas.


Deverá visar à melhoria do ambiente de negócios, ao aumento da competitividade e à eficiência do setor público para a geração de empregos. Além disso, deverá estar alinhado com os objetivos do planejamento estratégico da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia (SEPT/ME) com o objetivo de oferecer um marco regulatório trabalhista simples, desburocratizado e competitivo e promover a conformidade às normas e o direito do trabalho digno.


São objetivos específicos do programa tirar e catalogar a legislação trabalhista com matérias conexas e afins, consolidar e garantir que atos normativos com matérias conexas ou afins alterem a norma consolidada e não sejam publicadas isoladamente, garantir que o repositório de normas trabalhistas seja constantemente atualizado, revogar atos normativos exauridos ou tacitamente revogados e realizar audiência públicas.


PRÊMIO NACIONAL TRABALHISTA


O prêmio será concedido pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho (SEPT/ME), com a finalidade de estimular a pesquisa nas áreas de direito do trabalho, economia do trabalho e auditoria do trabalho. Ainda, será coordenado e implementado pela SEPT/ME, cujas despesas com a sua execução ficarão sujeitas a disponibilidade orçamentária.


LIVRO DE INSPEÇÃO DO TRABALHO ELETRÔNICO


Encontra previsão no artigo 628, par. 1º, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e será disponibilizado por meio eletrônico pela SEPTME a todas as empresas que tenham ou não empregados, sem ônus, por intermédio de sistema informatizado. Será instrumento oficial de comunicação entre a empresa e a fiscalização do trabalho, ficando as microempresas e as empresas de pequeno porte dispensadas da posse do Livro de Inspeção do Trabalho tradicional e também do eletrônico (eLIT), podendo aderir a esse último por meio de cadastro voluntário.


São princípios do eLIT a presunção de boa-fé, a racionalização e a simplificação do cumprimento das obrigações trabalhistas e das obrigações não tributárias impostas pela legislação previdenciária, a eliminação de formalidades e de exigências desnecessárias ou superpostas, a padronização de procedimentos e de transparência e o fomento à conformidade à legislação trabalhista e previdenciária, inclusive quanto às normas de segurança do trabalhador.


As comunicações eletrônicas realizadas por meio do eLIT, com prova de recebimento, são consideradas pessoais para todos os efeitos legais.


DA FISCALIZAÇÃO DAS NORMAS DE PROTEÇÃO AO TRABALHO E DE SAÚDE E SEGURANÇA NO TRABALHO


A SEPT/ME instituirá um canal eletrônico para o recebimento de denúncias, de comunicações sobre irregularidades trabalhistas e de pedidos de fiscalização. Esse canal poderá ser utilizado por trabalhadores, por órgãos e por entidades públicas ou privadas ou por qualquer interessado, sendo garantida a confidencialidade da identidade dos usuários. Dessa forma, não será permitido a qualquer pessoa que obtiver acesso à informação revelar a sua origem ou a fonte da fiscalização.


O decreto trata da atuação estratégica e preventiva da inspeção do trabalho e da autuação pela inspeção do trabalho.


DAS DIRETRIZES PARA ELABORAÇÃO E REVISÃO DAS NORMAS REGULAMENTADORAS DE SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO


O decreto dispõe que são diretrizes para elaboração e revisão das normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho:

  • redução dos riscos inerentes ao trabalho, prevenção de acidentes de trabalho e de doenças ocupacionais e promoção da segurança e saúde do trabalhador;

  • a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho, a valorização do trabalho humano, o livre exercício da atividade econômica e a busca do pleno emprego;

  • embasamento técnico-científico, a atualidade das normas com o estágio corrente de desenvolvimento tecnológico e a compatibilidade dos marcos regulatórios brasileiro e internacionais;

  • a harmonização, a consistência, a praticidade, a coerência e a uniformização das normas;

  • a transparência, a razoabilidade e a proporcionalidade no exercício da competência normativa;

  • a simplificação e desburocratização do conteúdo das normas regulamentadoras;

  • e a intervenção subsidiária e excepcional do Estado sobre o exercício de atividades econômicas, incluído o tratamento diferenciado à atividade econômica de baixo risco à saúde e à segurança no ambiente de trabalho.

Ficam vedadas as seguintes condutas na elaboração e na revisão de normas regulamentadoras, exceto se em estrito cumprimento a previsão explícita em lei: 1) criar reserva de mercado para favorecer segmento econômico em detrimento de concorrentes; 2) exigir especificação técnica que não seja necessária para atingir o fim pretendido; 3) redigir enunciados que impeçam ou que retardem a inovação e a adoção de novas tecnologias, processos ou modelos de negócios.


Serão priorizadas as situações de alto risco ocupacional e com maior propensão ao desenvolvimento de doenças e de acidentes do trabalho para fins de atuação normativa da fiscalização.


As Normas Regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho serão redigidas com clareza, com precisão e com ordem lógica, apresentando conceitos técnicos e objetivos, sendo que a sua elaboração e sua revisão incluirão mecanismos de consulta à sociedade em geral e às organizações sindicais mais representativas de trabalhadores e empregadores, seja por meio de audiências públicas ou de consulta à Comissão Tripartite Permanente. Além disso, deve haver submissão a processo de análise crítica quanto à necessidade de sua revisão em intervalos inferiores a cinco anos.


CERTIFICADO DE APROVAÇÃO DO EQUIPAMENTO DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL


O equipamento de proteção individual (EPI) somente poderá ser comercializado com a obtenção do certificado de aprovação, emitido pela SEPT/ME, a qual também disporá sobre os procedimentos e sobre os requisitos técnicos para emissão, para renovação ou para alteração do certificado que será emitido por meio de sistema eletrônico simplificado.


REGISTRO ELETRÔNICO DE CONTROLE DE JORNADA


O registro eletrônico de controle de jornada será realizado por sistemas e por equipamentos que atendam aos requisitos técnicos fundamentais que serão estabelecidos pela SEPT/ME. O objetivo é coibir fraudes e permitir o desenvolvimento de soluções inovadoras e garantia de concorrência na oferta de sistemas.


Os equipamentos e os sistemas de registro de ponto deverão obedecer a requisitos de confiabilidade, não permitindo alteração ou eliminação dos dados registrados pelo empregado, restrições de horário às marcações de ponto e às marcações automáticas de ponto, não exigindo autorização prévia para marcação de sobrejornada e permitindo pré-assinalação do período de repouso e ponto por exceção. Deverá ser permitida a identificação de empregador e do empregado e possibilitada a extração do registro fiel das marcações realizadas pelo empregado.


MEDIAÇÃO DE CONFLITOS COLETIVOS


Poderão ser realizadas mediações de conflitos coletivos pela Secretaria de Trabalho da SEPT/ME para resolução de conflitos por solicitação dos trabalhadores e por entidades sindicais de patrões e de empregados. A designação de mediador dentre os servidores públicos acontecerá sem ônus para as partes, e na hipótese de conciliação entre as partes será lavrada ata de mediação que terá natureza de título executivo extrajudicial.


EMPRESAS PRESTADORAS DE SERVIÇOS A TERCEIROS


O decreto reitera parte das regras contidas na Lei nº 6.019/74 com a redação trazida pela Lei nº 13.429/17 para definir a empresa prestadora de serviços a terceiros, dispondo que não configura vínculo empregatício a relação trabalhista entre os trabalhadores ou sócios das referidas empresas, qualquer que seja o seu ramo e a empresa contratante e a verificação do vínculo. As infrações trabalhistas e a imposição de multas em relação ao trabalhador terceirizado serão realizadas contra a empresa prestadora dos serviços, e não em relação à empresa contratante, salvo quando for constatada fraude da empresa contratante em relação à prestadora.


Se houver configuração de vínculo empregatício com a empresa contratante, deverão ser observados os seguintes requisitos: a não eventualidade; a subordinação jurídica; e a onerosidade e a pessoalidade.


Quanto à responsabilidade subsidiária da tomadora pelas obrigações trabalhistas em relação ao período da prestação de serviços, o texto dispõe que não implica qualquer tipo de desconsideração da cadeia produtiva quanto ao vínculo empregatício. Além disso, é vedada a caracterização de grupo econômico pela mera identidade de sócios, sendo necessárias a demonstração de interesse integrado e a efetiva comunhão de interesses, além da atuação conjunta das empresas dele integrantes.


TRABALHO TEMPORÁRIO


O decreto também reitera conceitos e regras na contratação já estabelecidas na Lei nº 6.019/74. Dentre outras regras, dispõe que não se considera demanda complementar de serviços, para fins de contratação temporária, as demandas contínuas ou permanentes e as demandas decorrentes da abertura de filiais. Ainda, é vedado à empresa de trabalho temporário contratar estrangeiro portador de visto provisório de permanência no país. Também é vedada de ter ou de utilizar, em seus serviços, trabalhador temporário, exceto quando o trabalhador for contratado por outra empresa de trabalho temporário e for comprovada a necessidade de substituição transitória de pessoal permanente ou a demanda complementar de serviço.


GRATIFICAÇÃO DE NATAL


O decreto repete algumas regras para pagamento do décimo terceiro salário, de que trata as Lei nº 4.090/62 e 4.749/65, com ênfase para o cálculo da gratificação de Natal dos empregados que percebem remuneração variável e pagamento proporcional.


VALE-TRANSPORTE


São reiteradas regras para pagamento do vale-transporte, a maior parte delas já previstas na Lei nº 7.418/85 com novas definições, conceitos e regras para concessão do benefício. Reitera que fica vedado ao empregador substituir o vale-transporte por antecipação em dinheiro ou por qualquer outra forma de pagamento, exceto quanto ao empregador doméstico.


DO PROGRAMA EMPRESA CIDADÃ


Dispõe sobre o Programa Empresa Cidadã, instituído pela Lei nº 11.770/08, destinado a prorrogar por 60 dias a duração da licença-maternidade e por 15 dias a duração da licença-paternidade.


Trata dos procedimentos para adesão ao programa por parte das empresas e prevê que, durante o período de prorrogação da licença-maternidade, da licença-paternidade e da licença à adotante: I) a empregada terá direito à remuneração integral, nos mesmos moldes devidos no período de percepção do salário-maternidade pago pelo Regime Geral da Previdência Social; e II) o empregado terá direito à remuneração integral.


DOS TRABALHADORES CONTRATADOS OU TRANSFERIDOS PARA PRESTAR SERVIÇO NO EXTERIOR


Enquanto estiver prestando serviços em outro país, o empregado contratado no Brasil ou transferido por seu empregador para prestar serviços no exterior poderá converter e remeter para o local de trabalho, no todo ou em parte, os valores correspondentes à remuneração, paga em moeda nacional.


A contratação de trabalhador por empresa estrangeira para trabalhar no exterior exige prévia autorização do Ministério do Trabalho e Previdência, devendo a empresa interessada comprovar: I) a sua existência jurídica, de acordo com a legislação do país de sua sede; II) a participação de pessoa jurídica domiciliada no Brasil em, no mínimo, 5% do seu capital social; III) a existência de procurador legalmente constituído no Brasil, com poderes especiais de representação, inclusive para receber citação; e IV) a solidariedade de pessoa jurídica a que se refere o inciso II no cumprimento das obrigações da empresa estrangeira decorrentes da contratação do empregado.


REPOUSO SEMANAL REMUNERADO E PAGAMENTO DE SALÁRIO NOS DIAS DE FERIADOS CIVIS E RELIGIOSOS


Reitera a regra já contida na CLT de que todo o empregado tem direito a um descanso semanal remunerado de 24 horas consecutivas, preferencialmente aos domingos, bem como nos feriados civis e religiosos.


Dispõe que será obrigatório o repouso remunerado nos dias feriados locais, até o máximo de sete, desde que declarados como tais por lei municipal, devendo ser adotada escala de revezamento nos serviços que exijam trabalho no domingo.


Será admitido, excepcionalmente, o trabalho em dias de repouso quando ocorrer motivo de força maior ou para atender à realização ou à conclusão de serviços inadiáveis ou cuja inexecução possa acarretar prejuízo manifesto, quando a empresa obtiver autorização prévia da autoridade competente. Ainda, deve constar a discriminação do período autorizado que, de cada vez, não poderá exceder 60 dias.


Caso haja serviço nos dias de repouso, a remuneração dos empregados que trabalharem nesses dias será paga em dobro, exceto se a empresa determinar outro dia de folga, trazendo o texto as regras e os critérios que deverão ser obedecidos para concessão e pagamento do Repouso Semanal Remunerado (RSR).


DA RELAÇÃO ANUAL DE INFORMAÇÕES SOCIAIS


A Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) conterá as informações periodicamente solicitadas pelas instituições vinculadas ao Ministério do Trabalho e Previdência, especialmente em relação: I) ao cumprimento da legislação relativa ao Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP); II) às exigências da legislação de nacionalização do trabalho; III) ao fornecimento de subsídios para controle dos registros relativos ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS); IV) à viabilização da concessão do pagamento do abono salarial; e V) à coleta de dados indispensáveis à elaboração dos estudos técnicos, de natureza estatística e atuarial, dos serviços especializados do Ministério do Trabalho e Previdência.


De acordo com o Decreto, a RAIS identificará I) o empregador pelo número de inscrição a) no CNPJ, b) no Cadastro Nacional de Obras e c) no Cadastro de Atividade Econômica da Pessoa Física; II) a pessoa jurídica de direito público e o órgão público pelo número de inscrição no CNPJ; III) o empregado pelo número de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF).


DO PROGRAMA DE ALIMENTAÇÃO DO TRABALHADOR


Dispõe que a pessoa jurídica beneficiária do PAT poderá manter serviço próprio de refeições, distribuir alimentos ou firmar contrato com entidades de alimentação coletiva.


As entidades de alimentação coletiva deverão estar registradas no PAT nas seguintes categorias: I) fornecedora de alimentação coletiva, podendo ser: a) operadora de cozinha industrial e fornecedora de refeições preparadas transportadas; b) administradora de cozinha da contratante; e c) fornecedora de cestas de alimento e similares para transporte individual; ou II) facilitadora de aquisição de refeições ou de gêneros alimentícios, emissora do PAT ou credenciadora do PAT.


As pessoas jurídicas beneficiárias, no âmbito do contrato firmado com fornecedoras de alimentação ou com facilitadora de aquisição de refeições ou de gêneros alimentícios, não poderão exigir ou receber qualquer tipo de deságio ou de imposição de descontos sobre o valor contratado, prazos de repasse que descaracterizem a natureza pré-paga dos valores a serem disponibilizados aos trabalhadores ou outras verbas e benefícios diretos ou indiretos de qualquer natureza não vinculados diretamente à promoção de saúde e à segurança alimentar do trabalhador.


A parcela paga in natura pela pessoa jurídica beneficiária, no âmbito do PAT, ou disponibilizada na forma de instrumentos de pagamento, vedado o seu pagamento em dinheiro, I) não tem natureza salarial, II) não se incorpora à remuneração para quaisquer efeitos e III) não constitui base de incidência do FGTS.


O Decreto 10.854/21 revoga e altera vários decretos sobre as matérias contidas no seu texto. Além disso, traz alterações relevantes e necessárias às normas trabalhistas infralegais, as quais esperamos abrirem caminho para a simplificação de procedimentos e para melhor clareza na aplicação das regras legais que regulamentam as relações de trabalho.

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