O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro de 2021 e do 1º semestre de 2022 mostram que a economia não foi tão ruim como os economistas previam. Foi até razoável para o setor de transporte, por ser uma atividade de meio, pois o setor é reflexo do PIB e, a depender do segmento, tem variação de duas a três vezes o seu valor. Desta forma, como o PIB de 2021 foi de 4,6% e o do primeiro trimestre de 2022 de 1,0%, no geral o setor teve um bom desempenho.
Os economistas estão revisando suas projeções para o crescimento econômico do Brasil neste ano de 1,5% para 2,5%. Essa mudança reflete as surpresas positivas para a atividade doméstica, para o mercado de trabalho e para os estímulos fiscais. O saque extraordinário do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) entre maio e junho e o mercado de trabalho aquecido tem impulsionado o aumento do consumo das famílias. Além disso, as medidas aprovadas pelo Congresso Nacional, como o incremento do Auxílio Brasil e dos subsídios tributários, deverão sustentar uma variação ainda positiva no segundo semestre, o que deve contribuir para o aumento do volume de carga, que normalmente já é maior que do primeiro semestre do ano.
Outros fatores apontam para um crescimento nos próximos meses. Um exemplo é a taxa de investimento do segundo trimestre, que teve alta de 21,6% em 2022 (até julho), maior resultado já registrado desde o início da série histórica em 2000. O índice de desemprego vem caindo a cada mês, e tudo indica que deve encerrar o ano abaixo de 8%.
Evolução dos custos do transporte rodoviário de carga
O Índice Nacional de Custo de Transporte de Carga (INCT) registrou em julho de 2022 uma inflação de 17,17% para o transporte de cargas fracionadas e de 29,19% para o transporte de cargas lotações ou fechadas.
Foi essa inflação fora do comum e muito acima da inflação geral que prejudicou o resultado do setor apesar do bom desempenho da economia. O aumento excessivo dos custos e a rapidez de como ocorreu ocasionaram grandes prejuízos aos transportadores já que eles não conseguiram ajustar os seus preços na mesma velocidade e no mesmo valor.
O combustível foi o insumo que mais subiu, alcançando 104% em um ano e meio segundo a Agência Nacional de Petróleo (ANP). Só no primeiro semestre de 2022 foram quatro aumentos anunciados pela Petrobras em um total de 67%.
Os veículos subiram 11% em média só no período, com alguns modelos subindo em torno de 70% em 18 meses.
A mão de obra, pelo menos, pela referência dos valores acertados no dissídio, foi reajustada na casa dos 12,5% (o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do período). No entanto, é de conhecimento geral que as empresas têm dado aumentos superiores a este valor, seja para os benefícios concedidos ou mesmo para reter os seus funcionários.
Neste caso, o que se espera é que no segundo semestre do ano tenhamos um alivio com relação aos aumentos dos insumos, permitindo aos transportadores que os repasses e ajustes sejam feitos. A Petrobras anunciou duas baixas em agosto (3,6% dia 4 e 4,07% dia 12) e, apesar de ser muito pouco perto do aumento total, já é um começo, e o que se espera agora é que seja uma tendência.
O mercado de transporte rodoviário de carga
As últimas pesquisas da NTC mostram que o transporte rodoviário de carga (TRC) não conseguiu recuperar o valor do frete rodoviário de carga, seguindo este como o maior problema a ser enfrentado pelo setor. Nos últimos anos, por meio do CONET, a NTC constatou que as empresas que operam no setor trabalham com fretes abaixo dos custos apurados por ela. Além disso, também operam com margens insuficientes para bancar a complexidade das suas operações, os investimentos necessários e os riscos envolvidos de forma a garantir o seu futuro e as necessidades impostas pelo mercado, situação que compromete em curto e médio prazos o atendimento das demandas da sociedade.
No primeiro semestre de 2022, alcançou-se o maior patamar de empresas que conseguiram aumentar o seu frete desde que a pesquisa se iniciou há 14 anos: foram 73% que reajustaram o frete, 11,3% em média. Entretanto, apesar dos expressivos aumentos que tivemos no período, houve 20% que concederam em média 6,9% de desconto no valor do frete.
Nota-se que grande parte do mercado compreendeu as dificuldades por que passa o setor. Contudo, mesmo para os que conseguiram um reajuste no frete, em comparação com a inflação do período medida pelo INCT da NTC, verifica-se que o aumento médio de 11,3% não foi suficiente, que dirá para os que cederam e baixaram frete. Ou seja, ainda não se vislumbrou no setor a necessária recuperação do valor do frete, e ele continua com uma defasagem na casa dos 14%.
Apesar de tudo, 45% dos participantes disseram que o primeiro semestre do ano foi melhor que 2021, 18% que foi igual e 37% afirmaram que foi pior. Acompanhando este resultado, 39% responderam que o resultado financeiro (lucro) melhorou, 18% que ficou igual e 43% que ele diminuiu.
A pesquisa ainda indica números preocupantes:
78% disseram que têm frete em atraso para receber, valor que compromete 11,4% do faturamento;
O prazo de recebimento está em 44,1 dias, apesar de boa parte dos custos serem pagos à vista;
26,1% dos pesquisados não estão conseguindo pagar os impostos em dia.
Porém, considerando tudo que aconteceu no primeiro semestre do ano, pode-se afirmar que o início do ano não foi ruim para o TRC, apesar de ser necessário destacar que houve uma diferença entre as duas principais atividades de transporte de carga, a fracionada e a lotação. Em geral, para a fracionada o desempenho foi pelo menos 10 pontos percentuais pior que a lotação, diferença essa que se justifica, pois é uma operação que demora mais para se adaptar às mudanças de mercado e, como os aumentos foram muitos e rápidos, não houve tempo suficiente para que todos os ajustem fossem feitos.
O fato é que a atual condição de mercado levou o otimismo do transportador quanto ao futuro a um patamar relativamente baixo, em que 27% acham que o mercado vai melhorar contra 43% que acreditam no contrário. O que se espera para o segundo semestre é que os preços dos insumos, em especial o diesel, se estabilizem ou mesmo que haja uma queda significativa. Quanto ao volume de carga a ser transportado, tudo indica que teremos um segundo semestre bom, e a incerteza fica por conta da postura do novo presidente eleito.
Sobre Lauro Jardim
É especialista em transportes, engenheiro de transportes formado pela Faculdade de Engenharia Industrial (FEI), pós-graduado em administração pela Escola Superior de Administração (ESAN) e mestre em administração de empresas pela Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). É corresponsável técnico pelos sites Tabelas de Frete e Guia do TRC, sócio da empresa LRV Assessoria e Treinamento em Transportes, colunista da revista O Carreteiro, professor universitário, autor e instrutor de vários cursos na área de transporte. Atualmente é assessor técnico da Associação Nacional do Transporte de Cargas e Logística (NTC), além de ser membro da Câmara Temática de Assuntos Veiculares do SENATRAN há 10 anos, membro da Junta Administrativa de Recursos de Infrações (JARI) da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) há 15 anos e membro do Conselho Estadual para Diminuição dos Acidentes de Trânsito e Transporte (CEDATT) do governo do estado de São Paulo há 12 anos.
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